SINOPSE: Landnámsöld, ano de 914. O príncipe Amleth (Alexander Skarsgård) está prestes atingir maioridade e ocupar o espaço de seu pai, o rei Horvendill (Ethan Hawke). Porém, seu tio, Fjölnir (Claes Bang), assassina brutamente o rei e sequestra Gudrún (Nicole Kidman), Rainha Gudrún. Vinte anos depois, Amleth conhece Olga (Anya Taylor-Joy), uma vidente, que o lembra que chegou a hora de cumprir a promessa que fez há muito tempo: salvar sua mãe, matar o tio e vingar o pai. O ex-príncipe então parte para uma odisseia em busca do tio.
Quando anunciaram “O Homem do Norte” fiquei bem empolgado, pois além do elenco com nomes, tais como Anya Taylor-Joy, Nicole Kidman, Ethan Hawke e Willem Dafoe; o diretor é Robert Eggers, que nos trouxe, na minha opinião, o melhor filme de terror psicológico que já assisti; “A Bruxa”.
“O Homem do Norte” é o primeiro filme de Robert Eggers que não tem sua temática ligada ao terror, podendo ser classificado muito mais como fantasia histórica e baseado na lenda medieval escandinava de Amleth, escrita pelo historiador dinamarquês Saxo Grammaticus, conhecida como a inspiração direta para a criação da clássica peça Hamlet, de William Shakespeare.
A história de Amleth (Alexander Skarsgård) é a típica história dos nórdicos antigos: ele é filho e herdeiro do rei Horvendill (Ethan Hawke). Porém seu tio, Fjölnir mata o monarca, toma para si o trono e rainha Gudrún (Nicole Kidman). Logo a jornada de Amleth se torna uma busca por vingança.
Esse tipo de tragédia é muito comum nas histórias da época do vikings, que viviam em pé de guerra contra outros povos, entre eles mesmos e dentro do próprio seio familiar. Mas então o que diferencia “O Homem do Norte” de outras produções como a série “Vikings”?
O que mais chama a atenção em “O Homem do Norte” é o minucioso trabalho de Robert Eggers e o roteirista Sjón em retratar da forma mais fiel possível a cultura dos vikings. Para isso o diretor e seu companheiro de roteiro envolveram historiadores, arqueólogos e linguistas.
Robert Eggers em entrevista disse: “Começamos a envolver historiadores e arqueólogos e muitos tipos de primeiros consultores na fase de roteiro. No trabalho para criar o filme, tudo era para ser uma réplica de algo em nível de museu, em vez de coisas que estamos inventando, então foi muita pesquisa e muito trabalho.”
Logo o que se vê em tela é uma representação muito diferente do que vimos em outras produções, como em “Vikings”, por exemplo. Diferente, mas não menos interessante. Ritos religiosos como o do começo do filme, parecem estranhos, mas dão o tom do que veremos em “O Homem do Norte”.
O idioma é algo bem trabalhado em “O Homem do Norte”. Apesar do elenco falar em inglês durante o filme, temos várias palavras e expressões da época dos vikings sendo utilizadas, bem como a escrita, com suas letras e runas.
A sociedade dos vikings é mostrada de forma mais direta e precisa. Os integrantes da realeza e das castas mais altas tinham todas as regalias a que tinham direito. Regalias essas, que eram sustentadas pelos escravos que forneciam tudo: de roupas a comida.
Mas é a religião, que se mistura muito com a cultura dos vikings, o ponto mais abordado em “O Homem do Norte”. Os rituais e as visões que os personagens têm dos deuses nórdicos mostram como esse povo se norteava, com essas divindades praticamente guiando cada passo deles. E exemplos não faltam para comprovar isso.
É uma profetisa (pessoas geralmente com alguma deficiência, que eram idolatradas e temidas pelos vikings por sua ligação direta com as divindades), interpretada pela cantora Björk, quem determina os rumos da vingança de Amleth, já adulto. E se não bastasse, em determinado momento, Amleth se encontra graças a um sacerdote, com a cabeça de Heimir (Willem Dafoe), em uma clara alusão a Mimir, uma das muitas figuras míticas dos nórdicos, que lhe diz todos os detalhes da morte de seu tio Fjölnir e a sua própria.
Posso citar também quando Amleth vai buscar uma espada que só poderá ser desembainhada para cumprir sua vingança e que tem sede por sangue humano. Além de armas mágicas, muito comum na mitologia nórdica, a sequência revela que o portador dela é um draugr, um mortos vivo que apresenta uma força super-humana e um tom de pele azulado.
Vendo essa sequência, duas referências com a literatura fantástica me vieram imediatamente à cabeça. A primeira é que a espada que Amleth vai buscar me lembrou muito a Stormbringer, arma que tem uma sede insaciável por sangue humano utilizada por Elric de Melniboné, protagonista de uma série fantástica. Não sei se o artefato dessa série de livros fictícios tem alguma relação com alguma arma existente na cultura nórdica (pesquisei, mas não encontrei nada), mas a coincidência é bem grande.
A segunda relação é do draugr com os mortos e as criaturas que ressuscitam em “Game of Thrones”, pois o trabalho de caracterização dessa figura mítica nórdica a deixou muito parecida com os Outros de “GoT”. E novamente, será que os responsáveis da série baseada em “As Crônicas de Gelo e Fogo” se basearam nos draugrs para criar suas criaturas gélidas e desmortas?
E a guerra? Esse aspecto é pouco retratado em “O Homem do Norte”, apesar de falarmos de uma sociedade guerreira. Por não ser o foco principal do filme, pessoas que gostam justamente desse aspecto dos vikings podem ficar decepcionadas. Entretanto, a cena em que os berserkers invadem a cidade de Rus, para saqueá-la é suficiente para mostrar toda a familiaridade desse povo com a guerra. E que cena meus amigos, pois toda a invasão dos vikings é filmada em plano-sequência!
Mas mesmo não tendo muitas cenas de guerra, a violência que permeia a cultura viking está presente, sendo Amleth o maior responsável por ela, com muitas mutilações, esquartejamentos e sangue que vemos em “O Homem do Norte”. Essas cenas servem para quebrar um pouco o ritmo mais lento que filme possui, já que o foco dele mostrar a história do protagonista e tudo que o rodeia.
A locação das filmagens é outro ponto positivo. Filmado na Islândia, fiquei encantado com as tomadas aéreas e amplas para as savanas geladas, as montanhas, as cachoeiras, as geleiras e as praias de areias negras do país. Junte a isso, o trabalho cuidado de figurino, maquiagem e habitações da época e vemos toda a beleza e dureza que essas ilhas isoladas eram no século X.
O roteiro tem um ritmo lento, mas nem por isso deixa de ser dinâmico, possuindo o tempo certo para cada elemento e personagem, mesmo os secundários, se desenvolverem, e com isso, prendendo assim sua atenção. E como disse, Robert Eggers e Sjórn sabem alternar a velocidade do filme, com momentos mais reflexivos e diálogos mais longos, com cenas de violência e ação, além de reservar um ótimo plot twist a respeito da história de Amleth.
Acompanhando o ótimo roteiro, as atuações entregues pelos atores e atrizes do filme é outro ponto positivo. Destaques para Willem Dafoe, que mesmo aparecendo pouco, dá um show novamente, para Nicole Kidman que vem fazendo ótimas performances e para Anya Taylor-Joy, que mesmo não sendo seu melhor trabalho aqui, mais uma vez se destaca como uma druida que foi capturada pelos vikings e agora é escrava deles. Até mesmo Alexander Skarsgård, que ainda é lembrado por seu trabalho em “True Blood” (ele era o vampiro Eric Northman), tem sua melhor atuação da carreira em “O Homem do Norte”.
Assisti ao filme duas vezes, sendo a segunda somente para constatar todo o cuidado histórico que o diretor e o roteirista tiveram para trazer uma produção cinematográfica bastante fidedigna ao que era a cultura viking, resultando assim em um filme com ótima fotografia, roteiro e atuações. E por tudo que disse até agora, é claro que vale muito a pena assistir “O Homem do Norte”!
Ficha Técnica:
Título Original: The Northman
Título no Brasil: O Homem do Norte
Gênero: Aventura Histórica
Duração: 137 minutos
Diretor: Sam Raimi
Produção: Robert Eggers
Roteiro: Robert Eggers, Sjón
Elenco: Alexander Skarsgård, Oscar Novak, Nicole Kidman, Claes Bang, Anya Taylor-Joy, Ethan Hawke, Willem Dafoe, Björk, Elliott Rose, Gustav Lindh, Eldar Skar, Phill Martin, Ingvar Eggert Sigurðsson, Olwen Fouéré, Kate Dickie, Ian Whyte, Hafþór Júlíus Björnsson, Magne Osnes, Ralph Ineson, Doa Barney, Tadhg Murphy, Ian Gerard Whyte, Katie Pattinson, Murray McArthur, Ineta Sliuzaite
Companhias Produtoras: Regency Enterprises, New Regency, Square Peg, Perfect World Pictures
Distribuição: Universal Pictures