SINOPSE: No passado, eles salvaram o mundo, mas agora levam vidas medíocres em uma cidade rural fora dos limites do tempo. Não há como fugir, mas Abraham Slam, Menina de Ouro, Coronel Weird, Talky Walky, Madame Libélula e Barbalien tentam empregar suas habilidades extraordinárias para se libertar desse incomum purgatório. Obrigados a disfarçar seus poderes, sua natureza e suas origens aos olhos dos habitantes locais, eles personificam uma típica família disfuncional, tentando criar para si uma vida normal.

Desde que comecei a ler “Gideon Falls” (o último volume sai esse ano aqui no Brasil), passei a me interessar por Jeff Lemire; tentando consumir mais e mais histórias suas. O talento do quadrinista é reverenciado pelos críticos e leitores de HQs, mas também por suas obras serem constantemente indicadas e vencerem aquele que é considerado o principal prêmio internacional da Nona Arte: o Eisner Awards.

Como já é um hábito meu, sempre procuro ler outra obra de um escritor para consolidar minha opinião sobre seu trabalho. Com as expectativas altíssimas devido a “Gideon Falls”, peguei “Black Hammer” para ler, que juntamente com “Sweet Tooth”, formam a tríade de grandes trabalhos do quadrinista.

Acho que a primeira coisa que é precisa falar sobre “Black Hammer” é que apesar de ser uma HQ sobre super-heróis, você não verá páginas e páginas com combates e lutas e porradaria. Em alguns momentos são mostrados relances dos nossos prisioneiros em ação, mas para contextualizar a história ou desenvolver algum personagem. O único evento desse tipo que aparece constantemente é a luta de Abraham Slam, Menina de Ouro, Coronel Weird, Talky Walky, Madame Libélula e Barbalien contra o Anti-Deus; mas novamente, como forma de incrementar a narrativa.

Os paladinos da justiça de “Black Hammer” são quimeras de super-heróis da Marvel e DC, algo bastante utilizado em outros quadrinhos. Abraham Slam tem fortes inspirações no Capitão América. Coronel Weird e Talky Walky claramente parodiam Flash Gordon e o robô da série “Perdidos no Espaço”. Barbalien é uma cópia do Caçador de Marte (até suas cores são iguais, mas invertidas: seu corpo é vermelho e sua capa verde). E Black Hammer é uma espécie de Thor do Quarto Mundo de Jack Kirby.

Mas não somente os heróis de “Black Hammer” são inspirados nas criações da Marvel e da DC, os vilões também. O principal antagonista, o Anti-Deus tem uma forte semelhança com Darkseid e um quê de Antimonitor.

Mas de todos os personagens que falei, os dois que mais se destacam na minha opinião são a Menina de Ouro e a Madame Libélula.

A Menina de Ouro é uma cópia do Shazam ao contrário, pois trata-se de uma mulher idosa nos dias atuais que toda vez que ela grita o nome do mago que lhe dá poderes, se transforma em uma menina superpoderosa de 10 anos. O problema é que na fazenda, ela está presa ao corpo de uma menina, não conseguindo retornar à sua idade real. Isso resulta em graves problemas psicológicos e situações muito engraçadas, pois como ela precisa manter as aparências para as pessoas da cidade, acaba sendo pega fumando, bebendo e falando muito, mais muito palavrão.

Já Madame Libélula é a uma bruxa do pântano que mora em uma casa assustadora com muitas portas e muitos segredos atrás de cada uma. Sua história é a mais pesada de todos os personagens e a mais sombria. O desenhista Dean Ormston que dá vida a maioria das páginas de “Black Hammer” diz que é sua personagem preferida, e tenho que concordar, pois além do traço dele cair muito bem nela, seu enredo beira o terror, gênero que amo.

Mas independentemente de eu ter personagens preferidos, vale destacar que cada um tem seu momento de desenvolvimento bem construído e sua importância dentro de “Black Hammer”.

Mas além dos personagens bem construídos, Jeff Lemire consegue trazer uma história que prende sua atenção desde o primeiro momento. O começo é lento, apresentando cada personagem, tanto antes de irem parar na fazenda como a situação atual, dez anos depois do cárcere nesse local estranho. Além disso, Lemire apresenta as localidades e as pessoas que moram na cidade.

Aos poucos, Jeff Lemire vai jogando pistas sobre o mistério da equipe de super-heróis ter ido parar na fazenda e o porquê não conseguirem sair dela. Aqui faço um parênteses para dizer: preste atenção em tudo que acontece nas páginas de “Black Hammer”, pois detalhes, acontecimentos e diálogos que parecem comuns ou banais são importantes para a trama, explicando ou fazendo ligação com algo que será mostrado mais para a frente.

Quando o mistério é revelado, fiquei imaginando como tudo estava na minha cara e como Jeff Lemire conseguiu me enrolar, mesmo deixando pistas atrás de pistas. Além disso, outra boa surpresa é quando Lemire mostra quem são os responsáveis pelos super-heróis terem ido parar na fazenda e quais as motivações para prendê-los lá.

Essa revelação é feita faltando ainda faltando alguns volumes para terminar ”Black Hammer”. Mas mais uma vez vemos o talento de Jeff Lemire, pois como em “Gideon Falls”, ele consegue levar a história para outro caminho tão instigante quanto o mistério inicial. O desfecho da história só poderia ser o apresentado por Jeff Lemire, depois que você junta todas as pistas. E por estar mais uma vez na cara, é que o final é tão bom.

E para coroar esse roteiro, Jeff Lemire quebra a quarta parede de uma forma que você não espera e que até hoje não tinha visto em nenhuma outra mídia.

Falando um pouco da arte, é preciso dizer que a mostrada por Dean Ormston casa perfeitamente com a história de Jeff Lemire. Seu traço é estranho de início, mas logo você se acostuma. E como diz o próprio Lemire: “Somente o traço de Ormston poderia dar vida a história insólita de ‘Black Hammer’”.

E a arte de Ormston fica melhor ainda quando ele está mostrando a história de Madame Libélula. O artista disse que se sente à vontade desenhando contos de terror. Não sei se é essa afinidade e conforto que ele sente, mas a estranheza do seu traço traz toda uma aura perturbadora que a personagem possui.

O potencial de “Black Hammer” é tão grande que a Legendary Entertainment vai adaptar os quadrinhos em universo live-action, produzindo filmes e séries. Tudo isso com supervisão direta e roteiros de Jeff Lemire.

Em uma declaração do próprio quadrinista: “É uma adaptação muito ambiciosa e já estou trabalhando na primeira parte, escrevendo o roteiro para um projeto que esperamos que se transforme em um universo compartilhado entre cinema e televisão. Qual o limite para “Black Hammer” nessas mídias? O céu é o limite.”

Lendo a HQ e a capacidade criativa de Jeff Lemire, acredito que não existe limite para o que podemos ver no “Hammerverso” do cinema e televisão.

“Black Hammer” foi eleita a Melhor Série Original de 2017 pelo Eisner Awards, principal prêmio internacional de quadrinhos. Prêmio ganho merecidamente, pois é uma história que explora o lado humano de super-seres de forma mais próxima a nossa, com boas doses de mistério e humor. Além disso, é uma trama de mistério muito bem construída, com boas reviravoltas e ideias originais.

Dito tudo isso, só posso declarar que vale muito a pena ler “Black Hammer!

Ficha Técnica:

Título Original: Black Hammer

Título no Brasil: Black Hammer

Autor: Jeff Lemire

Arte: Dean Ormston, Rich Tommaso

Letras: Todd Klein

Tradutor: Fernando Scheibe

Capa: Cartão

Volumes: 25

Número de páginas: 688

Editora: Intrínseca

Idioma: Português

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Publicado por Marcelo Santos

Quase biólogo, formado em Administração. Maníaco desde criança por filmes e séries. Leitor assíduo de obras de ficção, terror, fantasia e policial.

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